“Bem-Aventurados os que choram, porque serão consolados”
Chegamos a segunda das Bem-Aventuranças.
Esta, como resultado da primeira (v.3), destaca a diferença entre o crente e aquele
que não é crente. O mundo dos descrentes sempre esbraveja em seus discursos, a
necessidade de estar sempre sorrindo e alegre; ao passo que a Escritura
paradoxalmente anuncia que felizes são os que choram. Antes de tudo, vale
explicar que o choro aqui registrado, não é um choro comum. Sempre vemos muitos
aplicando este texto a toda e qualquer situação de pranto. Mas o Senhor Jesus
aqui trata de algo específico. Não é um choro como o de alguém que perdeu um
ente querido, ou sofreu um grande trauma.
O que Jesus quis dizer com “Bem-Aventurados os que choram”?
Parece até difícil entender o que
diz o versículo 4 do 5º capítulo de Mateus. Dizer que “sortudos”, “felizes” são
os que choram, os tristes, os que se lamentam... Isso é algo bem difícil de se
afirmar, pregar..., mas é isso mesmo!
Bem-Aventurados os que choram! Os
que choram são felizes, são aqueles que terão consolo. Bem-Aventurados os que choram.
E esse choro é espiritual e constante, como “aqueles que choraram uma vez e
ainda estão chorando” (Gr). É um choro espiritual, embora não resulte somente
em lágrimas internas. É o resultado de alguém que se viu pobre de espírito.
Quando percebemos que não podemos nos salvar ou mesmo sustentarmo-nos na
salvação, devido nosso estado miserável e vil, choramos. Os que choram são aqueles
que choram por seus pecados. São os que lamentam suas falhas diariamente, que
entendem que seu maior problema é o pecado que os destrói, afasta de Deus e os impede
de ser servos melhores. É um sinal da genuína conversão, quando vemos a nossa
tragédia, e sem esperança, nos agarramos a Cristo.
Por que choramos?
Choramos por nossa pobreza espiritual.
O pobre de espírito vê a sua total
dependência de Deus, sabe que é falido e incompetente para se salvar. Quando
percebemos isso, vamos ao desespero, como aqueles que ouviam Pedro pregar em
Atos 2.37. Estes se desesperaram em seu espírito. Quando percebemos que somos
vazios, nos entristecemos.
Choramos por nosso próprio pecado.
A razão da pobreza espiritual é o
pecado. Não somos santos porque somos pecadores. Paulo nos explica bem esta
condição da natureza humana em Romanos 3.9-18. O pecado desonra a Deus, é uma
negação de Sua onisciência, em acharmos que estamos sós; zomba de Sua paciência
e desconfia de Sua fidelidade, ao tempo em que não nos atentamos as Suas promessas
de suprimento.
Nós choramos por nosso estado pecaminoso.
Todo bom cristão que olha para si
mesmo, percebe que não é tão santo quanto poderia ser, que não se parece com
Cristo como deveria parecer. Quando vemos nosso dia-a-dia, o que pensamos e o
que nossos olhos estão vendo, não podemos negar que somos terríveis pecadores. Se
nos perguntarmos “-O que fiz? O que disse? O que pensei? Como agi com meus semelhantes?”
– Assim como eu, você se lamentará, batendo no peito e afirmando-se miserável
(Romanos 7.24).
Choramos porque odiamos nossa condição.
Nos questionamos em oração: “-Por
que sou assim? Por que não consigo ser melhor? Por que luto há anos contra esse
pecado e não consigo me livrar?”. Somos levados por Deus a odiar-nos, a odiar
nosso pecado, a odiar-nos, porque não nos parecemos com Cristo. Somos levados a
níveis profundos de depressão, tristeza, angústia, lamento, e isto me faz
lembrar de momentos preciosos da minha vida, porque desde que fui convertido,
tenho chorado constantemente por causa de quem eu sou.
Mas também choramos pelos pecados do mundo.
Quando nos olhamos, só vemos
miséria em nós, e lamentamos, mas quando olhamos o mundo, também choramos. Choramos
quando vemos nos jornais as desgraças que o homem faz com seu semelhante, que é
imagem de Deus; quando ouvimos sobre tráfico sexual, pedofilia, incestos,
desigualdades, pessoas morrendo em corredores de hospital, AIDS, ditaduras,
corrupção, homens e crianças-bomba, aborto, a drogadição e o vício em álcool...
Enfim, o que o homem sem Deus faz consigo, além do fato de muitos estarem indo
para o inferno porque o preferiram a renderem-se ao Salvador. Nos lamentamos
por isso e choramos. Choramos por pensar em quão depravado e mau o homem pode
ser.
Choramos pelo que todo esse pecado fez a Jesus.
Esta é obviamente nossa maior tristeza.
Olhamos para nós, para o mundo e vemos o quanto nosso pecado ofende a Deus. E
principalmente pelo que foi feito para que tivéssemos perdão. Essa é a “tristeza
do Evangelho”, saber que por causa do meu pecado, Deus esmagou Seu único e
amado Filho na cruz (Isaías 53.10); que por nossa causa, Jesus ficou
desfigurado, foi cuspido e xingado, zombado; além de receber toda a ira de
Deus, todo o castigo do inferno por nossos pecados... Ele nos amou tanto e O
desprezávamos! Choramos porque não conseguimos retribuir - e como isso dói o
coração - porque sabemos que Ele morreu por todos os nossos pecados, e sabemos
que amanhã, faremos tudo aquilo que matou nosso Amado Jesus. O meu Amor morreu
por mim e eu só sei desagradá-Lo, entristecer Seu Espírito!
A minha iniquidade matou o meu
Jesus e por isso odeio o pecado e choro, pois sou miserável. Como diz a Escritura:
“Mas sobre a casa de Davi, e sobre os
habitantes de Jerusalém, derramarei o Espírito de graça e de súplicas; e
olharão para mim, a quem traspassaram; e prantearão sobre ele, como quem
pranteia pelo filho unigênito; e chorarão amargamente por ele, como se chora
amargamente pelo primogênito.” (Zacarias 12:10). Tantas vezes já chorei,
desejei a morte para não mais pecar, ou mesmo passei dias em profunda
melancolia por ter entristecido meu Salvador!
Isto pode parecer estranho a alguns,
principalmente para o mundo. E a razão disto é justamente a época em que
vivemos. Por este motivo, esta Bem-Aventurança parece loucura àqueles que não
foram feitos tristes por Deus. O ‘evangelho’ de hoje diz que devemos sentir-nos
bem-sucedidos, que ter tristeza é falta de fé, que “agora é só vitória!”. Para
este mundo hedonista, sentir-se mal é algo contrário a filosofia vigente, de
modo é ensinado que aquilo que você puder fazer para se sentir feliz é valido,
ainda que seja à custa dos outros. Todavia não é assim com o crente, pois a
tristeza evidencia que paradoxalmente somos felizes.
O fato de chorarmos confirma que
fomos salvos, e que o Reino de Deus é nosso. Paulo nos mostra que a tristeza pelos
nossos pecados é sinal de genuíno arrependimento (II Coríntios 7.10); Pedro
chorou amargamente ao ver Jesus e nega-Lo (Mateus 26.75), de modo que podemos
observar sua real conversão ali, pois após este momento, seu coração se alegrou
ao ver Jesus ressurreto (João 21.1-8).
Em vivermos, entendermos e
pregarmos isto, ficaremos contra o mundo, mas também contra a maioria dos
evangélicos. É até estranho pregar sobre esta Bem-Aventurança a uma igreja cheia
de doentes espirituais e psicológicos, mas só experimentaremos mais de Deus,
quando formos aos mais baixos níveis de autoestima. Um vaso, para ser cheio de
Deus, precisa antes ser esvaziado.
Esse choro nos acompanhará por toda
a vida, mas a promessa que ele carrega também nos seguirá. E a promessa da Escritura é que seremos
consolados.
O consolo está em saber que, embora
seja terrível o meu pecado, seguro e fiel é o meu perdão (Salmos 51.17). O
crente que chora, se agarrará em Cristo, e a paz de Jesus que traz felicidade o
abraçará, pois Ele mesmo enviou o Espírito, que nos consola (Salmos 30.5).
Temos também outro consolo peremptório: A bendita esperança de Romanos 8.23-24.
Segundo a Escritura, teremos um novo céu e uma nova terra, onde não mais
habitará a injustiça e qualquer tipo de pecado (II Pedro 3.13). Neste lugar, não
haverá mais pranto, nem clamor, nem dor (Apocalipse 21.4). Bem-Aventurados os que choram
por seus pecados, porque Deus pessoalmente os consolará!
Quem é o homem feliz? Muitos
procuram a felicidade verdadeira, a alegria cristã. Muitos dariam o mundo
inteiro para tê-la. O problema delas, e talvez também seja o seu caso, é uma
falta de profunda convicção de pecado, pois só com essa visão correta e exata
da gravidade do seu pecado, você chorará e sentirá o consolo de Deus em te
dizer: “-Perdoado!”. A Bíblia nos diz que onde abundou o pecado, superabundou a
graça de Deus (Romanos 5.20). Davi bem sabia disso, por isso pediu no Salmo 51
que Deus renovasse a alegria da sua
salvação. Precisamos chorar, ter uma tristeza santa, para experimentarmos
um júbilo também santo, uma alegria santa, um santo consolo, que só Deus pode
nos dar.
Você é feliz? Tem chorado por causa
dos seus pecados ou já perdeu toda a sensibilidade?
Talvez você se pergunte: “-Então eu
preciso ficar triste, forçar o choro em meu coração?”. Esta não é uma obra ou
algo que fazemos de propósito. É o Espírito Santo que causa a tristeza no
coração bem-aventurado. Jesus não nos manda chorar, antes, elogia o salvo, o chama
de sortudo e feliz, por ter sido levado ao choro.
Você sente a graça de Deus em sua
vida a ponto de faze-lo chorar?
Lembre-se de quem você queria ser
no dia da sua conversão e olhe para o que você é hoje. Era assim que queria
estar? Era este o nível de santidade que queria alcançar? Essa derrota não o
entristece?
O mundo chora por não ter coisas, o
crente chora por não ser santo. E isto é maravilhoso! Uma obra santa está sendo
feita em nós. Deus está nos consolando e nos santificando, pois quanto mais
odiamos o pecado, mais perto d’Ele ficamos, e quanto mais desprezarmos as coisas
deste mundo, mais nos apegaremos a Ele.
Que Deus nos faça chorar
desesperadamente, para que experimentemos Seu santo consolo.
Soli Deo Gloria.
_______________________________________________________________
Esboço baseado no livro: Estudos no Sermão do Monte. Martyn Lloyd Jones, Ed. FIEL. Adquira o livro aqui.
> Comentário Bíblico Esperança (Aqui);
> Livro: Crucificando a Moralidade. Ed. FIEL (Aqui);
> Meditações no Evangelho de Mateus. Ed. FIEL (Aqui).
Comentários
Postar um comentário